ANALISE

Santos, um porto fechado para o desenvolvimento regional

por José Manoel Ferreira Gonçalves*

04 de Junho de 2021, 08h26

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Divulgação

As atividades portuárias em Santos estão sendo pautadas pelo agronegócio. Commodities chegam e partem pelo Atlântico, deixando atrás de si o caos. O movimento cresce de forma desorganizada, sem gestão, nem projeto. Os silos avançam sobre o espaço que pertence à comunidade, quase invadindo as casas de quem mora nos arredores.

Apenas as empresas de navegação, os retroportuários (transportadoras baseadas no uso de caminhões) e a empresa que monopolizou o trecho do sistema ferroviário que dá acesso ao porto de Santos são beneficiados com essa estrutura precária. Enquanto isso, o porto e a cidade estão sitiados. Santos e sua população são penalizados com esse modelo – e correm enorme risco com o que acontece na região portuária, onde são operadas e armazenadas mercadorias perigosas o suficiente para exterminar vidas e comprometer o rico habitat local.

Basta dizer que um navio tanque está atracado entre a entre a ilha Barnabé e Alemoa, sob uma constante possibilidade de explosão, o que seria catastrófico para a Baixada Santista (basta lembrar o acidente ocorrido no ano passado com o armazenamento de nitrato de amônio no Líbano). O estrago aqui seria muito maior. A embarcação em questão é um verdadeiro navio-bomba, com potencial equivalente a 55 artefatos equivalentes ao de Hiroshima. O próprio distrito industrial da Alemoa concentra outras atividades perigosas, tornando o local um verdadeiro barril de pólvora, ao lado de terminais portuários sem controle ambiental e fiscalização adequada

Outra situação gravíssima é a dos trilhos nos portos, e tende a piorar com o tratamento que o governo federal tem dado a esse tipo de transporte, deixando a cargo das empresas fazerem o que bem entendem com o restante de nossa malha ferroviária. O trem que chega até Santos poderia ser um importante vetor de integração e valorização turística, mas está entregue a interesses bem particulares.

Há ainda muitos aspectos que precisariam ser enfrentados e demandam projetos de engenharia, começando pela construção de um túnel entre Santos e Guarujá, a fim de revitalizar a margem esquerda do porto, e chegando até a melhoria de eficiência e disposição da dragagem no canal, que, aliás, está parada há quase dois meses.

O porto de Santos concentra, enfim, uma série de oportunidades de desenvolvimento regional e geração de empregos locais, hoje desperdiçadas pela omissão e negligência das autoridades, com a benção da sociedade civil, que não reage a essa incompetência oficial.

O que o porto de Santos proporciona atualmente em benefícios para a região litorânea é muito pouco para uma cidade que tem na engenharia, no legado de Saturnino de Brito e outros tantos históricos engenheiros, uma de suas maiores virtudes.

Precisamos reviver essa história e tornar o porto um lugar seguro para a cidade voltar a respirar e crescer.

*José Manoel Ferreira Gonçalves é engenheiro, jornalista, advogado, professor doutor, pós-graduado em Ciência Política pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo, integrante do Engenheiros pela Democracia e presidente da Ferrofrente.