REPORTAGEM ESPECIAL

Mãe de criança com microcefalia fala sobre os desafios da doença

Aos 31 anos Lidinéia trouxe ao mundo Fernanda, sua pequena vencedora

por Robson Morais

21 de Junho de 2016, 10h06

Mãe de criança com microcefalia fala sobre os desafios da doença
Mãe de criança com microcefalia fala sobre os desafios da doença

Trezes anos se passaram desde que Lidinéia de Freitas Batista Nabor deu a luz pela primeira vez. A menina, absolutamente perfeita e saudável, agora ajuda a mãe a cuidar da irmãzinha que completa ainda seus seis meses de vida hoje (21). Fernanda, o bebê, é portadora da microcefalia causada pelo contato da mãe com o zika vírus. Em meio a condição imposta, a criança é uma vencedora das "pequenas coisas, lutas e conquistas", como resume a mãe.

A reportagem do GazetaMT esteve com mãe e filha por poucas horas, o bastante para falar dos desafios e ver de perto um pouco de como tem sido a rotina de toda uma família que se adaptou e preparou para a chegada inesperada de um bebê especial. A condição de Lidinéia é a mesma hoje compartilhada por outras 17 mães cuja microcefalia nos bebês fora confirmada pela Secretaria Municipal de Saúde de Rondonópolis. 50 casos forma descartados e há ainda aproximadamente 20 sob investigação.

O vírus

Quando descobriu que daria a luz pela segunda vez, Lidinéia iniciou imediatamente as visitas regulares ao médico. Nos dois primeiros meses da gestação, nada de anormal na gravidez. Da passagem do segundo para o terceiro mês, a mãe teve o contato com o zika.

Lidinéia foi internada na Santa Casa de Misericórdia do município. Seu caso, um dos primeiros registrados em Rondonópolis, ainda em maio de 2015, era de preocupação e desconhecimento por parte dos médicos. Empolada, a paciente recebeu a medicação para o tratamento de uma alergia, até que exames comprovaram seu quadro clínico. Melhor de saúde, Lidinéia recebeu alta.

Os desafios

Lidinéia Nabor viu pela TV reportagem sobre zika e microcefalia. Foto-Luan Dourado/GazetaMTFoi já próxima ao sexto mês da gravidez que a mãe viu pela TV uma reportagem sobre o caso de mães que deram luz a bebês microcefálicos, até então supostamente, devido ao contato com o vírus. "A primeira vez que ouvi essa ligação foi numa reportagem e eu já estava no quinto para o sexto mês da gravidez.  Ainda assim, na época, não me caiu a ficha de que eu havia tido zika e isso comprometeria minha gestação", conta Lidinéia.

Somente no oitavo mês os médicos que acompanhavam a gestação de Lidinéia perceberam que havia algo incomum no bebê: a cabeça não estava crescendo, enquanto o resto do corpo se desenvolvia normalmente. Fernanda veio ao mundo com exatos 30cm de circunferência craniana.

De início o susto: "Fiquei desesperada por saber que teria uma filha com microcefalia. Quando eu fiz a ultrassom e o doutor falou que eu teria que fazer um exame mais especifico... Foi quando eu realmente descobri. Fiquei chocada, eu não estava esperando", relata a Lidinéia.

A mãe segue contando que a família toda teve que se preparar. "De repente tudo mudou, estávamos esperando uma coisa e acontece outra. Quando eu fiquei sabendo fique em silencio, mas depois contei pra família". Ainda no processo de adaptação, o desafio ainda é o psicológico. "Não é fácil ter um bebe especial".

Dentro de casa Lidinéia conta com o apoio de quem precisa. Fora dela também, ainda que com limitações. A mãe teve de pagar do bolso os exames mais fundamentais de Fernanda, indisponíveis a ela e a outras mães na rede pública. Oferecidos a Fernanda, porém, são os atendimentos de fisioterapia e fonoaudiologia, além de consultas mensais com a pediatra no Serviço de Atenção Especializada, o Sae, de Rondonópolis.

Fernanda sorri ao ser fotografada pela reportagem do GazetaMT. Foto-Luan Dourado/GazetaMT

A pequena vencedora

A cada consulta, uma evolução. Visão, audição perfeitamente normais no bebê. Coordenação motora em constante melhora. Vitória e privilégio de Fernanda, que poderia ter sido ainda mais comprometida pela gravidade da microcefalia. Lidinéia, aos 31 anos de idade, compartilha do sentimento infantil da filha e evolui na mesma medida em que Fernanda também ascende.

Há dias ruins, de cansaço emocional. Fernanda tem se mostrado excessivamente hiperativa e exige atenção integral da mãe, que largou o curso de Direito e o trabalho para se dedicar à nova missão. "Não sei as demais mães, mas eu entro em parafuso alguns dias", desabafa Lidinéia.

A mãe tem medo do futuro. "As portas se fecham para as crianças especiais", diz. Outro ponto é a falta de referência, já que não há adultos com microcefalia ligada ao zika. "Será que ela vai ser plenamente feliz? Será que a Fernanda vai estudar, poder ir pra escola?" questiona Lidinéia.

Seja como for, completa a mãe, impecável e inatingível é a disposição presente em ambas, mãe e filha, para lutar e seguir com a vida nas condições mais normais o possível. Lidinéia cobra direitos para sua filha e os demais bebês, implora para que outras mães recorram à Justiça e procurem saber mais sobre os benefícios aos quais tem direito e que podem dar-lhes melhores condições.

Tudo a exemplo de sua própria vencedora Fernanda. "Se alguma coisa faltar, tenho certeza de que não foi por falta de buscar e lutar pela minha filha", diz Lidinéia. Fernanda, ainda tão nova,  também já luta por seus direitos.